Nenhum a menos: Integração de um povo que viveu debaixo das estrelas….

É bom ser professor! Melhor ainda quando as vitórias conseguidas resultam de caminhos difíceis de percorrer. Ser professor com bons alunos, é quase sempre tarefa simples ….Ser professor de jovens que não querem (?) ser alunos, isso sim, é tarefa árdua de cumprir!
O trabalho com alunos ciganos tem sido um desafio para a Escola actual, após muitos anos de um afastamento significativo do sistema educativo.
Quando concorri para o Agrupamento de Escolas de Calendário imediatamente assisti a citações que o rotulavam como “escola de ciganos” imbuídas de poderosos significados maléficos, e pautados por sentimentos de hostilidade. Tenho de confessar que algum receio me assolou…afinal eu ainda sou da geração que dizia: “Come a sopa senão o cigano vem com o saco e leva-te!” Contudo o receio inicial rapidamente foi para mim um desafio. Constatei, desde logo, que na Escola não andavam mais do que quatro alunos ciganos, o que me levou a questionar sobre o paradeiro de tantas crianças ciganas, que habitavam os bairros sociais limítrofes do Agrupamento. Descobri que a retenção por idade levava a que estes meninos ciganos, de uma forma mais ou menos consentida, evitassem a escola.
Facilmente se compreende a pouca motivação destes jovens e das suas famílias para a Escola. Se a nossa desconfiança em relação aos Ciganos é grande, também a deles em relação a nós o é! Esta minoria étnica tem uma herança de perseguição que não será facilmente esquecida. Séculos de história de um povo nómada associadas a negócios ilícitos, e a poderes sobrenaturais perseguem o nosso imaginário. E o imaginário da cultura cigana será porventura, favorável aos nossos valores culturais? Esta é a herança histórico-cultural que a sociedade ocidental trouxe para as nossas salas de aula! Como trabalhar com esta minoria cultural?
As mudanças estruturais não se fazem num curto espaço de tempo, como tal só com intervenções pensadas e organizadas em rede se podem conseguir resultados efectivos. É importante compreender que pequenos passos são grandes vitórias! É importante compreender que as diferenças não têm de desaparecer, devem apenas ser entendidas, respeitadas e integradas! E por fim é importante compreender, que o tempo de mudança na História é quase sempre longo! Quando conseguimos trazer à escola um aluno de cultura cigana que estava em abandono, temos a certeza que mais uma ponte se começou a construir e uma nova página de história se abriu….Poder-se-ia então perguntar: há soluções milagrosas para esta situação? Claro que não! Podemos sim, desenvolver políticas educativas de escola, adequadas a alunos de cultura cigana, partindo de pressupostos básicos: assumir sem restrições as problemáticas da escola, fazer um diagnóstico real da situação, partindo posteriormente para a definição de estratégias de intervenção. Só imbuídos destes pressupostos podemos construir Projectos Educativos que respondam de forma eficaz aos desafios que as diferenças culturais impõem. E por fim desmistificar o clima que rodeia este povo. É importante que a escola viva estas diferenças culturais pacificamente. Tarefa difícil? Sim. Impossível não…

Bibliografia de apoio

  • Apresentação do Orador
  • SOS Racismo (2001). – Saúde e liberdade: ciganos, números, abordagens e realidades. Lisboa: SOS Racismo.
  • ACDI, Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, I.P.
  • Oliveira, Jorge, Retrato da população pediátrica de etnia cigana em Vila Nova de Famalicão
  • Formosinho, João, (1991) A construção social da educação escolar
  • Mendes, Maria Manuela (2005), Nós, os ciganos e os Outros, Etnicidade e Exclusão Social